Pelas primeiras avaliações dos
parlamentares que compõem a CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito)
funcionava assim a associação criminosa entre o bicheiro Carlinhos Cachoeira e
a construtor Delta.
1. A Delta se habilitava a uma
licitação na qual houvesse garantia de aditamento do contrato (isto é, de
reajuste posterior do contrato).
2. Tendo essa garantia, apresentava um
preço imbatível, muitas vezes inexequível. No caso do aeroporto de São Paulo, por
exemplo, o maior lance foi de R$ 280 milhões. A Delta apresentou uma proposta
de apenas R$ 80 milhões.
3. Ganhava a licitação e depois
aguardava o aditivo. Enquanto isto, a empresa ficava sem caixa para bancar seus
fornecedores - de peões de obra a vendedores de refeições e cimentos. Aí
entrava Cachoeira garantindo o capital de giro da empresa com dinheiro
clandestino, do jogo. Ou com o fornecimento de insumos, através de empresas
laranjas. Estima-se que o desembolso diário do bicheiro fosse de R$ 7 milhões,
mais de R$ 240 milhões por mês.
4. Quando vinha o aditivo, a Delta
utilizava o recurso - legal - para quitar as dívidas com Cachoeira, através das
empresas laranja. Era dessa maneira que Cachoeira conseguia legalizar o
dinheiro do jogo. Quando algum setor relutava em fazer o aditivo, Cachoeira
recorria ao seu arsenal de escândalos e chantagens, valendo-se da revista Veja.
Foi assim no episódio do DNIT
(Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte). Aparentemente houve um
conflito entre Cachoeira e o diretor Luiz Antonio Pagot. Providenciou-se a
denúncia, destinada apenas a derrubar as resistências de Pagot. Como dizia um
bom observador das cenas brasilienses, Cachoeira pretendeu assar o porquinho e
acabou colocando fogo na choupana.
O que era para ser um alerta para Pagot
coincidiu com a ação do governo de demitir a diretoria do DNIT.
O rastreamento das ações de Cachoeira
pela CPMI se concentrará nos aditivos contratuais. E também nos pagamentos
efetuados pela Delta a fornecedores. A partir daí será possível identificar o
enorme laranjal que constituía o esquema Cachoeira, assim como os esquemas de
corrupção nos órgãos contratantes.
Outro trabalho será identificar as
reportagens da revista que serviram aos propósitos de Cachoeira. No caso da
propina dos Correios, por exemplo, sabe-se que o grampo foi armado entre
Cachoeira e o diretor da revista, com vistas a expulsar um esquema rival dos
Correios. Detonado o esquema, o próprio Cachoeira assumiu o novo esquema, até
ser desmantelado pela Polícia Federal.
Em todo esse processo, foi crucial a
ligação do bicheiro com a revista. Foi graças a ela que Cachoeira conseguiu
transformar seu principal operador político - senador Demóstenes Torres - em
figura influente, capaz de pressionar a máquina pública em favor do bicheiro. E
foi graças a ela que intimidava recalcitrantes na máquina pública.
Ontem O Globo saiu em defesa da Veja,
com um editorial em que afirma que "Civita não é Murdoch". Referia-se
ao magnata australiano Rupert Murdoch, cujo principal jornal, na Inglaterra,
foi flagrado cometendo escutas ilegais para gerar reportagens sensacionalistas.
Em uma coisa O Globo está certo:
Murdoch negociava os grampos com setores da polícia; já Roberto Civita negociou
com o crime organizado.
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